sexta-feira, 11 de maio de 2012

São Pedro Mártir por Fra Angélico








São Pedro de Verona


Dotado de raro carisma de pregador e convertedor de hereges, esse extraordinário frade dominicano libertou, por meio de uma Cruzada, toda a Toscana da heresia dos maniqueus, sendo por eles martirizado
                                                                                                                                         Plinio Maria Solimeo
Martírio de São Pedro de Verona - Domenichini, Pinacoteca de Bolonha (Itália)
No domingo, 5 de abril de 1252, dois frades dominicanos viajavam pela estrada que liga as cidade de Como e Milão, na Itália. Enquanto caminhavam, iam rezando o Saltério. De repente, saindo da mata, dois homens os atacaram, desferindo sobre um deles terrível golpe de maça. O frade caiu por terra e, lentamente, molhando dois dedos no próprio sangue, escreveu no chão: “CREDO”. Mal tinha acabado a escrita, cravaram-lhe um punhal no coração. Morto o grande inimigo de sua seita – seita dos cátaros ou maniqueus – os dois hereges lançaram-se sobre o outro dominicano que, de joelhos, rezava, matando-o no mesmo instante.
Esses frades assassinados  tão barbaramente eram dois filhos espirituais de São Domingos. Um deles, Pedro de Verona, o Inquisidor-mor de toda a Itália, era tão grande pregador e polemista, que os hereges tinham sido obrigados a proibir seus correligionários de ouvi-lo devido ao número de conversões; o outro, era seu companheiro, Frei Domingos.
São Pedro de Verona tinha tal fama de santidade, que foi canonizado no mesmo ano de sua morte. Sua festa é comemorada no dia 4 do corrente.
Lírio nascido no lodo
Nada pode ser mais favorável para a formação de um Santo do que um lar verdadeiramente cristão, pois de uma árvore má não pode sair um bom fruto. Mas a Providência pode abrir exceções a essa regra, e muitas vezes abre. Foi o que sucedeu com São Pedro de Verona, filho de pais hereges maniqueus.
Como nota um biógrafo seu, “parece que havia nascido com uma aversão natural pelas máximas desta abominável seita e a todos que pretendiam encaminhá-lo a ela. Prevenido por uma  graça oculta, igualmente desprezava, mesmo antes do uso da razão, os afagos, carícias, solicitações bem como as ameaças, golpes e maus tratos dos que desejavam, com a maior ânsia, instruí-lo desde cedo nos elementos de sua heresia”.[i]
Como os hereges não tinham escolas na cidade, o pai enviou-o  a um professor católico para aprender as primeiras letras. Este semeou no coração do pequeno Pedro, ávido das verdades eternas, os fundamentos da única Religião verdadeira, a católica.
Certo dia, um tio herege dos mais fanáticos, encontrou-se com o menino que voltava das aulas, e o interrogou sobre o que estava aprendendo. Pedro inflamou-se então na explicação do Símbolo dos Apóstolos (o Credo), que refuta o erro fundamental daqueles hereges. Por mais que o tio argumentasse, o menino defendia com ardor o que aprendera.
Preocupado, o herege foi procurar o irmão e alertou-o no sentido de que, caso não impedisse o menino de continuar a freqüentar as aulas, este estaria perdido para a seita. O pai de Pedro, seja por não ser dos mais fanáticos maniqueus, supondo talvez que depois de adulto, ser-lhe-ia mais fácil convencê-lo, deixou-o com o professor. E, mais tarde, enviou-o à Universidade de Bolonha.
"Era lastimável a corrupção de costumes que reinava entre a juventude daquela Universidade. E é verossímil que isto mesmo movesse o pai de Pedro a enviá-lo para lá, parecendo-lhe que, uma vez que a licenciosidade de costumes lhe estragasse o coração, seria então fácil apagar dele as impressões da doutrina católica”.[ii] Mas Deus preservou-o do vício como o tinha protegido da heresia.
Foi em Bolonha que Pedro tomou conhecimento de uma nova ordem de frades pregadores e de seu fundador, Domingos de Gusmão, em cujo hábito, negro e branco, estão refletidas as duas virtudes que ele mais amava: a humildade e a pureza. Apesar de ter apenas 16 anos, o adolescente apresentou-se a São Domingos, que o admitiu incontinenti no noviciado.

O noviço julgou seu dever domar de vez todas as más inclinações, triste herança dos pobres filhos de Eva, por uma mortificação espantosa. Praticamente não comia, pouco dormia, e retalhava o corpo com flagelações. Em pouco tempo seu organismo ressentiu-se e ele foi atacado por mortal doença. Mas uma milagrosa intervenção divina salvou-lhe a vida.
Zeloso demolidor das heresias
São Pedro Fra Angelico, (sé. XV), Museu de São Marcos, Florença (Itália)
Após sua profissão religiosa, Frei Pedro dedicou-se com afinco aos estudos, tornando-se capaz de, em pouco tempo, receber a ordenação sacerdotal e “de subir no púlpito, de atacar os hereges, e de parecer nas mais belas ocasiões para a defesa e sustentáculo da Igreja. Ele se comportava com tanto zelo que, segundo os termos de Santo Antonino, todas suas ações pareciam animadas de uma muito viva fé e ardente caridade”.[iii] Desde sua ordenação, Frei Pedro pedia sempre no Santo Sacrifício da Missa a graça de derramar seu sangue pela Fé.
Começou então a parte verdadeiramente extraordinária de sua vida, que tem poucas similares na História da Igreja.
Com um dom especial para mover os corações mesmo dos pecadores mais endurecidos e dos hereges, sua pregação era acompanhada  de milagres portentosos. O que convertia muitos, para desespero do inimigo infernal que procurava de todos os modos impedi-lo de falar.
Certa vez pregava ele na praça do mercado de Florença, pois não havia igreja suficientemente grande na cidade para conter a multidão que fora ouvi-lo. De repente, surgiu um enorme corcel negro, correndo a toda brida em direção aos ouvintes, parecendo disposto a esmagar tudo que encontrasse pela frente. O Santo, com o Sinal da Cruz, dissipou como fumaça esse fantasma feito pelo demônio.
De outra feita, depois de uma pregação, um rapaz pediu para se  confessar. Acusou-se de ter dado um pontapé em sua mãe. Frei Pedro repreendeu-o severamente, dizendo-lhe que por esse ato ele merecia ter o pé decepado. O infeliz ficou compungido, mas interpretou mal a admoestação do Santo, pois chegando em casa, cortou o pé. Houve um vozerio contra Frei Pedro, acusado de imprudência. Este foi até a casa do penitente, pegou-lhe o pé decepado, e com uma bênção juntou-o de novo à perna!
Como os líderes dos hereges estavam desesperados pelas perdas que sofriam, um deles resolveu “desmascarar” o Santo. “Eu vou, disse ele aos seus,  fingir-me de doente, e aproximar-me-ei dele com a multidão; ele  impor-me-á as mãos e dir-me-á que eu estou curado. Então eu declararei sua impostura”. E fez isso. Frei Pedro, no entanto, disse-lhe: “Se estás doente, sejas curado; se não, fiques doente”. No mesmo momento, o homem foi atacado por uma terrível febre, que o levou a um estado desesperador. Confessando sua falta, pediu ao Santo que tivesse pena de sua alma e de seu corpo. Fez uma abjuração de seus erros e foi curado.[iv]
Numa outra ocasião um pseudo-bispo dos maniqueus desafiou o Santo para um debate público. Como o sol estava abrasador e ele não conseguia refutar os argumentos do Santo, para provocá-lo e desviar o assunto, disse-lhe: “Por que não pedes ao teu Deus que nos envie uma nuvem para nos proteger?”. - “Fá-lo-ei da melhor vontade,respondeu o servo de Deus sem hesitar, se me prometeres abjurar  tua heresia, caso vejas a oração ouvida”. Isto foi aceito; então disse Frei Pedro: “Para conhecerdes todos, e confessardes à uma, que o nosso Deus, único onipotente é o criador das coisas visíveis e invisíveis, peço-Lhe, em nome de seu Filho Jesus Cristo, que nos envie uma nuvem para nos defender dos raios do sol”. E ao fazer o sinal da Cruz, imediatamente apareceu no céu sereno uma nuvem amena que aliviou a todos.[v]
A fama do grande taumaturgo precedia-o nas cidades, sendo  ele acolhido com o repicar dos sinos das igrejas. Todos queriam receber sua bênção, vê-lo de perto, tocá-lo. Foi mesmo necessário, em Milão, preparar uma cadeira portátil fechada, para protegê-lo da multidão em seus deslocamentos de um lugar para outro.
Colóquios com três bem-aventurados celestes
Sepulcro de São Pedro Mártir, apresentando ao centro cena de sua canonização, realizada na cidade de Perugia, em 1253, por Inocêncio IV - Basílica de São Estórgio, Capela Portinari, Milão (Milão)
São Pedro de Verona foi muito favorecido com visões celestes. As virgens e mártires Santa Catarina, Santa Inês e Santa Cecília freqüentemente lhe apareciam, e tinham com ele familiar entretenimento. Isso foi-lhe causa de uma grande provação, pois um dia um frade ouviu aquelas vozes femininas na cela do santo, e comunicou ao Superior. Este, no capítulo, repreendeu Frei Pedro, que em vez de se defender, disse apenas: “Sou um grande pecador”, pois, em sua humildade, não queria que soubessem dos favores celestes que recebia. Foi então relegado a um convento distante, com a proibição de sair e de pregar.
Certo dia, nessa reclusão forçada, Frei Pedro lamentou-se amorosamente diante de um Crucifixo, dizendo: “E, então, meu Deus! Vós, que conheceis minha inocência, como podeis sofrer que eu permaneça tanto tempo na infâmia?”. Nosso Senhor respondeu-lhe: “E eu, Pedro, não era inocente? Merecia os opróbrios e as dores com que fui acabrunhado no curso de minha Paixão? Aprende assim de mim a sofrer com alegria as maiores penas, sem ter cometido os crimes que te são imputados”.[vi] Mas os superiores deram-se conta de seu erro e chamaram de volta o grande pregador.
Em 1232 o Papa Gregório IX, que conhecia o zelo e a pureza de doutrina de Pedro de Verona, nomeou-o Inquisidor-Geral da Fé. Foi enviado então a Florença para examinar uma Ordem religiosa que estava surgindo, fundada por sete varões daquela cidade. Graças a seu testemunho favorável, a Ordem dos Servos de Maria foi confirmada.
Frei Pedro de Verona não combatia a heresia só com palavras mas “persuadiu os católicos a se coligarem em uma espécie de cruzada para expulsar do país todos os hereges; e, em menos de seis anos, logrou ver católica a Toscana inteira”.[vii]
Ardor apostólico coroado com o martírio
Os hereges não se conformavam com o deperecimento de sua seita. Assim, coligaram-se para exterminar aquele que tantos estragos fazia.
Por uma luz sobrenatural, São  Pedro conheceu que o momento de seu tão desejado martírio estava próximo. E o disse a muita gente, por exemplo, a uma multidão de 10 mil pessoas que o ouviam em Milão, no Domingo de Ramos.
No sábado seguinte à Páscoa, como vimos, dirigia-se de Como, onde era Prior, para Milão, quando foi martirizado aos 46 anos. Como foi o primeiro mártir da Ordem Dominicana, é também conhecido como São Pedro Mártir, e foi imortalizado por seu irmão de hábito, o célebre Beato Fra Angélico, em várias pinturas.


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Notas:
1. Abbé J. Croisset, S.J., Año Cristiano, Madrid, Saturnino Calleja, 1901, t. II, p. 342.
2. Id. ib., p. 343.
3. Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, par Mgr. Paul Guérin, Paris, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, 1882, tomo V, p. 80.
4. Vies des Saints à l’usage des Prédicateurs, Abbé C. Martin, Librairie Religieuse et Ecclésiastique, Paris, 1865, tomo II, p. 133.
5. Cfr. Santos de Cada Dia, organização do Pe. José Leite, SJ., Editorial Apostolado da Oração, Braga, 1987, vol. II, p. 181.

6. Les Petits Bollandistes, op. cit., p. 81.

7. Abbé Croisset, op. cit. p. 345.

Ave Donna Sanctíssima - São Pedro de Verona



 http://www.youtube.com/watch?v=9oAwOPJhb3I



Ave Donna santissima
Ave, Donna santissima,
regina potentissima!

La vertù celestiale
colla gratia supernale
en te, virgo virginale,
discese benignissima.

La nostra redemptione
prese encarnatione
k’è sença corruptione
de te, donna sanctissima.

Stand’al mondo sença ‘l mondo
tutto fo per te giocondo:
lo superno e’l profondo,
e l’aere suavissima.

Quasi come la vitrera
quando li rai del sole la fiera
(dentro passa quella spera
k’è tanto splendidissima),

stando colle porte kiuse
en te Cristo se renchiuse:
quando de te se dischiuse
permansisti purissima.

Altresì per tua munditia
venne ‘l sol de la iustitia
in te, donna di letitia,
sì foste preclarissima.

Tu se’ porta e tu se’ domo:
di te naqque Diu et homo,
arbore col dolçe pomo,
ke sempre sta florissima.

Per la tua scientia pura
conservasti la scriptura:
tutta gente s’asicura
a te, donna purissima.

Dimandasti per pietança
de li apostoli consolança
a la tua transmutança,
lor compania carissima.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

O que é a missa?


Homilia de Pe Marcelo Tenório (26/04/12)
V. Ave Maria, Gratia plena, dominus tecum, benedicta tu in mulieribus, et benedictus frutus ventris tui Jesus.
R: Sancta Maria, mater Dei, ora pro nobis peccatoribus, nunc et in hora mortis nostrae. Amen.

V. Ora Pro nobis sancta Dei Genitrix,
R: Ut digni efficiamur promissionibus Christi.

A última Ceia do Senhor, a Missa In Cœna Domini, é um momento de júbilo e um momento de profundo pesar, de uma profunda tristeza. De júbilo, porque o Senhor instaura o Seu sacrifício, o mistério da Missa - é a Missa que Ele celebra. E, nesta Missa, Ele se dá: não mais os cordeiros antigos, não mais o sangue de touros e de cabritos, mas dEle mesmo que se entrega em resgate. É a primeira Missa que Nosso Senhor celebra como Sumo e eterno Sacerdote. Por isso, São Paulo vai dizer aos hebreus que Nosso Senhor não entrou no santuário construído com mãos humanas, mas de uma vez por todas Ele, como sacerdote eterno, como vítima, com Seu próprio sangue, entra no Santo dos Santos uma só vez e, assim, resgata por um só ato a humanidade inteira.

É júbilo porque a Missa nos é dada e por que a Santíssima Eucaristia é entregue à Igreja para que, renovando este gesto, possamos nós, da Igreja militante continuar na história, até a consumação dos séculos, este memorial da paixão, morte e ressurreição. Padre Pio respondeu alguém que o interrogou sobre o que é a Missa: 

“A Missa é o calvário todo. E a minha responsabilidade é única no mundo.”

 Também hoje, Nosso Senhor nos dá o mandamento do amor. E este mandamento do amor é o “amar a Deus sobre todas as coisas”. E é neste amar a Deus sobre todas as coisas que o Filho nos dá este exemplo, fazendo a vontade do Pai, e se entrega até a morte e morte de cruz, como cantávamos antes do evangelho: “Cristo se fez por nós obediente até a morte, e morte de Cruz, e por isso Deus o exaltou e deu o nome acima de todo o nome”.

Também, a instauração do sacerdócio católico. Hoje, nosso Senhor não só nos deixa a Eucaristia, o Seu sacrifício; não só nos dá o Seu mandamento de amor, mas também instaura o Seu sacerdócio. E, como dizia muito bem o nosso Arcebispo Dom Dimas na Missa dos Santos Óleos: “O sacerdote não é apenas um alter Christus, um outro Cristo; o sacerdote, na verdade, é Cristo, porque o sacerdote empresta a Nosso Senhor suas mãos, sua voz, todo o seu ser, todo o seu corpo, para que, através destas pessoas ungidas, Cristo continue a governar, a santificar e a ensinar.”

Era São João Maria Vianney que dizia: 

“Ide aos anjos e pedi a eles o perdão dos pecados, e eles vos dirão: não podemos. Ide aos anjos e pedi a todos eles que vos dê o pão do céu, e eles responderão: não podemos. Ide à Santíssima Virgem e pedi também o perdão dos pecados e o Pão do Céus, e a Santíssima Virgem responderá: não posso. Mas, ide ao mais simples dos sacerdotes, santo ou pecador; só ele poderá responder: teus pecados estão todos perdoados.”

 Eis o júbilo da festa de hoje, acompanhado pelos sinos e pelo Gloria. Mas, daqui a pouco, Nosso Senhor se despede e vive aquilo que O espera: o martírio, o calvário, o abandono. E, então a Igreja entra no sofrimento do Senhor e convida a todos nós a estarmos juntos com Ele no Getsêmani, a não abandoná-lo, a não deixá-lo sozinho. Todos foram embora, ninguém ficou. Até mesmo João, que volta depois; mas, naquele momento todos vão embora. João não ousa, em nenhum momento, dizer: “Que me preguem na cruz com o meu Senhor”. Apenas some, desaparece. Cristo está só, mas Sua Mãe Santíssima, com certeza, o acompanha de longe, talvez sem nem saber onde seu Filho estava preso, onde seu Filho se encontrava, mas Ela estava unida a Ele. Os demais fugiram apavorados diante do aparente fracasso de Nosso Senhor; este fracasso que vai ser aniquilado com a vitória da cruz no Sábado Santo, aos primeiros raios de sol do Domingo da Páscoa.

Este momento, para nós, é um momento sagrado, é um momento sublime, em que podemos contemplar Nosso Senhor em dois aspectos: na sua profunda alegria em ter consumado tudo e feito a vontade do Pai ao extremo, como João vai nos falar “Amou-nos até o fim” – In fine dilexit – mas também na angústia, na dor, na desolação que cairá sobre Ele.

E o que nós sabemos? 

Que o peso da cruz é o nosso peso, que somos nós que lhe pesamos na cruz. O Seu suor com sangue é por causa dos nossos pecados: somos nós que Lhe pesamos, somos nós que aumentamos as Suas angústias. Não foram os demônios que condenaram Jesus à morte, fomos nós: nós o condenamos, nós somos os responsáveis pela Sua morte e – o pior – nós somos responsáveis pela Sua paixão, que se arrasta até o fim dos séculos em cada pecador que se obstina no pecado, até em nós quando continuamos imersos em nossas falhas, em nossas podridões, ou até mesmo em pecados veniais que, diante de Deus e diante daquilo que Ele deseja para nós – a perfeição e o Céu – não deixa de ser atraso e empecilho contra o testemunho do primeiro amor, do primeiro Mandamento que é amar a Deus sobre todas as coisas, e do mandamento de amarmos ao próximo como, ou – às vezes, ou muitas vezes, ou quase sempre – mais que a nós mesmos.

 Que esta santa Missa in Cœna Domini abra para nós a porta das graças de Deus, a fim de que, neste Tríduo Santo, tenhamos a graça das graças, que é perseverar até o fim, até o último instante da nossa vida, como costumo dizer: “A graça não é começada em mim, a graça é terminada em mim.” Se começamos bem e não terminamos bem o que fizemos, acontece o que São Domingos Sávio dizia: “Se no final de minha vida não tiver me tornado santo, foi inútil ter passado por esta vida.”

Acompanhemos Jesus em cada instante, em cada momento, em Sua paixão que se abre nesta Última Ceia, ao lado de São João, o discípulo que Ele mais amava; ao lado de São Pedro que, apesar de seu temperamento, amava a Nosso Senhor; ao lado dos demais; mas, entre eles, estava Judas, o traidor, aquele que seria melhor nunca ter nascido.

Homilia proferida no dia 5 de abril de 2012, Missa da Ceia do Senhor (Lava-pé

segunda-feira, 7 de maio de 2012

A Imaculada Conceição da Mãe de Deus


Marcos Roberto Bonelli


Introdução
Quando consideramos a graça inicial da Mãe de Deus, uma das questões que se apresenta é: em que momento ela foi infundida na alma de Nossa Senhora?
A resposta a esta questão nos leva a contemplar a Imaculada Conceição da Mãe de Deus.
Inúmeros autores já escreveram sobre este tema.
No artigo anterior tratei dele sob o aspecto da inimizade total que existe entre Nossa Senhora e o demônio. Desta vez gostaria de considerar o privilégio da Imaculada Conceição em si mesmo. São considerações simples, com o simples intuito de, com a ajuda de Deus, levar os nossos leitores a um maior amor pela Virgem.
Nunca devemos nos esquecer de voltar nossas reflexões em direção à estima, ao amor, ao culto prático da Virgem Maria, em suma, ao excelente resultado espiritual de um aumento de devoção para com a Mãe de Deus.
Esperamos que, com este modesto artigo, Deus conceda a muitos, e mesmo a todos que o lerem, uma maior inteligência da fé, a graça de compreender um pouco mais a sabedoria das obras que Ele nos fez conhecer e crer.
Para isso, veremos mais de perto os elementos que compõem a definição do dogma da Imaculada Conceição.
 
A preservação do pecado original
Lembremo-nos de que uma lei misteriosa de herança comunica a todos nós a triste queda de Adão. Por este pecado, nosso primeiro pai perdeu a justiça original, essa veste sobrenatural concedida com tanta liberalidade, na sua pessoa, à natureza humana.
Quando nossa alma espiritual, criada por Deus, une-se à matéria para começar uma existência humana, pelo fato de que nós pecamos em Adão, pelo fato de que o pecado de Adão nos é misteriosamente imputado, esta graça é recusada à nossa alma. E Deus, assim, desvia dela o seu olhar de Pai!
Nossa Senhora nasceu de Adão como todos os outros filhos dos homens. E, entretanto, Ela não contraiu esta mancha.
Livre do contágio, Ela recebeu, ao contrário, na sua alma, desde o primeiro instante, a luz claríssima de uma extraordinária graça santificante. Ao invés de ser objeto de aversão, Ela é tratada desde o primeiro instante de sua existência com um amor especialíssimo.
Esta primeira consideração nos mostra um favor capaz de causar em nós uma alegria admirativa e de colocar em nossos lábios as felicitações mais doces para com a Mãe de Deus.
Esta consideração nos permite também compreender o ódio que os inimigos de Nossa Senhora têm pela Imaculada Conceição. A beleza original de Maria manifesta nossa sujeira.
Proclamá-la imaculada é confessar que somos pecadores.
Esta confissão é repugnante aos que proclamam a bondade nativa do homem, aos que dizem que todos os homens nascem livres de qualquer inclinação ao mal, aos que negam o pecado original, aos que crêem, enganando-se, que não têm pecado, entregando-se totalmente a seus vícios, sem desejar mudar de vida.
Usando como pretexto a dificuldade de compreender como nós herdamos o pecado de Adão, eles se levantam contra a fé.
Quanto a nós, confessemos humildemente nossa mancha original, confessemos nossos próprios pecados no sacramento da confissão, confiando no socorro daquela que nunca foi tocada por qualquer mancha de pecado: Tu és toda bela, Maria, e não há em ti mancha original!
Submetamos nossa pobre inteligência à infinita sabedoria de Deus, e à maior de suas obras: a Sempre Virgem Maria.
A Igreja aplica a Nossa Senhora este texto do livro dos Provérbios:
 
Agora, pois, filhos, ouvi-me: Felizes os que guardam os meus caminhos. Ouvi as minhas instruções, e sede sábios, não queirais rejeitá-las. Feliz o homem que me ouve, e que vela todos os dias à porta da minha casa, e que vela às suas vigas. Aquele que me encontrar, encontrará a vida e obterá do Senhor a salvação” (Provérbios 8, 32-35).
 
A Igreja quer nos mostrar que Nossa Senhora nos ensina, nos instrui. Ora, quão poucas são as palavras dela que os Evangelhos nos transmitiram! Porém, com tão poucas palavras de Nossa Senhora, muitas coisas de enorme saberia foram ditas.
 
Ela nos ensina também com seus atos. Aquele que ensina a verdade mostra ter alguma proximidade com a sabedoria, mas quem fala pouco e vive bem mostra que a possui mais perfeitamente. E assim foi com Nossa Senhora.
 
Para aprendermos de Nossa Senhora devemos dedicar nossa inteligência à consideração de quem Ela é, do que Ela fez e de que modo, deixando de ocupar nossa alma com o que é fútil, com o que é palha e pó diante de Deus para ficar com o ouro puro do exemplo que Sua Santa Mãe nos deu.
 
Cada festa da Santíssima Virgem é uma ocasião, para nós, de meditar o que Nossa Senhora nos ensina em particular, por ocasião de cada uma delas.
 
Em pouca coisa que a Sagrada Escritura fala dela, muito nos é ensinado.
 
E como é certo que algo, para ser mais amado, primeiro deve ser mais conhecido, segue-se que para crescermos no amor a Nossa Senhora, é necessário considerar mais devagar suas perfeições, seus bens, e as obrigações enormes que temos para com Ela por todos os benefícios que sem cessar recebemos de suas mãos.
 
 
Preservação por uma graça e um privilégio únicos
Em meio à multidão incontável dos filhos de Adão, não há nada que nos autorize a excluir quem quer que seja da mancha do pecado original, a não ser a Mãe de Deus.
Como uma árvore toda verdejante, cheia de flores e frutos, preservada no meio de uma floresta toda consumida pelas chamas, como uma página que permaneceu intacta no meio de um livro roído pelas traças, assim é Nossa Senhora entre os filhos de Adão.
Maria é amada por Deus com um amor imenso, para ser abençoada deste modo entre todas as mulheres.
 
Em vista dos méritos do Salvador do gênero humano, Jesus Cristo
Não nos esqueçamos deste terceiro elemento. Ele não somente é característico, como também ele responde aos ataques que os hereges fazem contra a Igreja, de que ela colocaria Nossa Senhora no lugar de Cristo, com não sei que espécie de mariolatria.
No ensinamento da Igreja, a Imaculada Conceição é uma obra não somente de Deus Criador, mas também de Deus Redentor.
Muitos grandes doutores da Igreja pararam diante da dificuldade de conciliar a pureza original de Maria com a necessidade universal da Redenção.
O dogma da Redenção era tão evidente que para conciliá-lo com a Imaculada Conceição foi necessária a demonstração do teólogo franciscano Duns Escoto, segundo a qual este privilégio, bem longe de excluir Nossa Senhora da ação redentora de seu Filho, era o fruto mais excelente da redenção que Ele obteve.
Nosso Senhor redimiu Nossa Senhora pelos méritos que Ele conquistou na cruz, mas com antecedência, e a fez imaculada desde o primeiro instante de sua existência. Os méritos de Cristo não a restauraram, mas a preservaram.
Maria é a glória mais puríssima de Jesus Redentor.
Essa é a grande tradição da Igreja. Tudo está submetido a Cristo, tudo é sua glória, para que tudo seja levado a Deus Pai por Cristo.
Cuidemos de fazer crescer sempre nossa devoção para com Nossa Senhora e de nos dirigir a Ela para sermos, por Ela, conduzidos e mantidos na única verdadeira via, que é Jesus Cristo.
Se Maria conservava e meditava em seu coração todas as coisas que via e ouvia de Cristo, façamos o mesmo com os exemplos que Ela nos deixou, e corrijamos nossos erros tomando Nossa Mãe como o mais puro modelo de virtudes. Difundamos sua grandeza diante dos homens, porque ela faz brilhar a grandeza de Nosso Senhor, que a concedeu à Santíssima Virgem. Torná-la conhecida, para nós mesmos e para os outros, é conquistar a salvação.

Aquele que me ouve não será confundido; e os que se guiam por mim não pecarão. Aqueles que me tornam conhecida terão a vida eterna” (Eclesiástico 24, 30-31).

Veja o vídeo, o outro lado do Papa Bento XVI

http://www.youtube.com/watch?v=GNjUqgXVFxQ&feature=related